Filosofia na Escola Secundária Jaime Moniz - Funchal

19
Abr 07

    Não há liberdade sem uma organização social. Esta implica um exercício de dominação por parte de um poder legítimo, que é investido de autoridade. Por outro lado, o equilíbrio entre o exercício deste poder e as liberdades individuais é sempre precário, exigindo uma constante negociação. É preciso procurar harmonizar os ideais e os desejos pessoais com a vida em sociedade. Mas, em compensação, podemos afirmar que a realização das liberdades individuais não poderia verificar-se se não houvesse uma sociedade organizada em instituições. As organizações políticas e sociais não visam apenas promover a igualdade e a justiça; visam também proporcionar aos cidadãos o máximo desenvolvimento das suas potencialidades.
      A organização e a estruturação da sociedade civil num determinado território remete-nos para o conceito de Estado. O que é o Estado? É um conjunto organizado de instituições (políticas, jurídicas e administrativas) que em conjunto estruturam a sociedade no interior de um dado território.
      Como terá surgido o Estado?  Como se justifica o seu poder?
      Em diferentes momentos da história, os filósofos procuraram responder às questões da origem do Estado e da legitimidade do seu poder.
     

      ARISTÓTELES (382-322 a. C.), na sua obra "Política", definia o homem como animal político, acreditando ser a participação na vida prática da "polis" (cidade organizada e com autarquia) a verdadeira função do indivíduo. O Estado surge como resposta à necessidade de os indivíduos conviverem em harmonia. Da família - forma de organização elementar - às aldeias e das aldeias à cidade-estado (pólis), Aristóteles descobre uma evolução, um percurso do ser humano que é, por natureza, um ser político. Com efeito, a polis (ou Estado) apresenta-se como o lugar ideal de exercício de direitos e de deveres do cidadão. O Estado é, na perspectiva de Aristóteles, a condição de realização do próprio indivíduo.
      Se, para a filosofia política aristotélica, o Estado é ponto de partida, nas teorias modernas de meados do século XVII, o Estado é visto como resultado, ou seja, é produto de um acordo estabelecido entre os indivíduos em sociedade.
    

     Com efeito, se, até ao século XVI, o exercício do poder tinha, no mundo ocidental, um fundamento religioso - o poder era considerado de origem divina - a partir do século XVI, com a filosofia política de Maquiavel, o poder político demarcou-se da esfera religiosa e das preocupações morais tradicionais. Esta autonomização da política perante a religião levou a que se considerasse que o fundamento do exercício do poder soberano residia num contrato social. Esta teoria fundamenta a legitimidade do Estado, considerando que tal contrato visaria, por um lado, garantir as liberdades dos indivíduos, conservando os seus bens e colocando-os ao abrigo da violência, e, por outro lado, permitir o exercício da vontade geral, orientando-a para o bem comum.
     

      As teorias contratualistas de Hobbes, J. Locke e Rousseau partem da ideia de uma estado de natureza que tem de ser ultrapassado em prol da defesa de direitos irrevogáveis.
     Segundo John Locke (1632-1704), o estado de natureza (sociedade sem organização política) é um estado de convivência pacífica, em que os indivíduos, seres livres e racionais, se entendem e respeitam mutuamente. No entanto, a produtividade resultante do trabalho e empenho de cada um gera disparidades, acabando por levar ao conflito. A partir do momento em que os interesses particulares em torno da propriedade e da posse de bens se evidenciam, os indivíduos sentem a necessidade de assegurar os seus direitos fundamentais. Locke enuncia-os como direitos naturais, a saber: vida, liberdade e propriedade. Através de um contrato social, conferem ao Estado o dever de zelar pelos seus direitos fundamentais. Aquele que representa o Estado terá de cumprir a sua missão, sob pena de ser destituído legitimamente pelos indivíduos sempre que seja posto em causa. A verdadeira soberania, o poder, encontra-se nas mãos do povo.

 

Horacio@Freitas


Uma vez que muitas decisões, como a decisão de acabar com as agressões planetárias, passam, em grande medida, pelas orientações polºiticas das nações e só depois pela acção individual, importa descobrir as articulações entre a ética, o direito e a política.
A liberdade é um valor indiscutível de cada ser humano. Todavia, a vida em sociedade impõe limites a esta liberdade. É necessário conciliar o exercício do poder, que promove a justiça social, e a liberdade individual.
Enquanto ser autónomo, agente moral com direitos e deveres, o ser humano é também cidadão. O que é que significa ser cidadão? Ser cidadão é conviver com outros seres igualmente dotados de liberdade, com direitos e deveres. Existe, assim, um conjunto de pressupostos constitutivos dos sujeitos que permitem que lhes sejam atribuídos esses direitos e deveres. Esses pressupostos são:
- o carácter relacional
- a capacidade de assumir a responsabilidade pelos seus próprios actos (imputabilidade)
- o reconhecer-se protagonista de uma história (identidade)
- a estima e o respeito por si mesmo.
Estas condições estão na base das relações interpessoais. Tais relações traduzem-se numa coexistência de liberdades. É por isso que a sociedade civil exige a regulação do direito, e requer uma organização política, representada pelo Estado, capaz de pôr em prática esse direito, para poder concretizar a justiça.
Numa primeira aproximação, podemos estabelecer as seguintes relações:
a) relação justiça-direito: o direito confere forma e rigor à justiça, cabendo à justiça a realização do direito;
b) relação Estado-justiça: o Estado não outro fim que não seja a justiça. Deve realizá-la, torná-la efectiva;
c) relação direito-Estado: o Estado é o agente do direito, cabendo-lhe agir em nome dele e dentro dos seus limites, a fim de realizar a justiça.
A consciência moral não possui penas uma dimensão pessoal. Ela exprime-se na vivência em comunidade. Por conseguinte, passa-se o mesmo com a ética. Os valores pessoais dependem, pelo menos em parte, da pressão social. Existe um conjunto de normas e de regras sociais que configuram a ética individual.
Sendo assim, a responsabilidade moral é inseparável da responsabilidade política e jurídica, a qual estabelece os padrões do modo correcto de viver em sociedade. Entre a moral individual e a moral pública existem interacções que definem aquele que se considera ser o modo mais correcto de agir.
"O homem tem uma inclinação para entrar em sociedade, porque em semelhante estado se sente mais como homem, isto é, sente o desenvolvimento das suas disposições naturais. Mas tem também uma grande propensão a isolar-se, poruqe depara ao mesmo tempo em si com a propriedade insocial de querer dispor de tudo ao seu gosto e, por conseguinte, espera resistência de todos os lados(...)" - Kant - A paz perpétua e outros Opúsculos.
Este texto de Kant revela-nos a dupla faceta do ser humano: a sociabilidade e a insociabilidade. Pela primeira, o ser humano desenvolve as suas disposições naturais; pela segunda, resiste à própria ordem social. Este antagonismo está na base da criação do direito. De facto, é preciso compatibilizar a necessidade de viver em sociedade com as exigências da vida colectiva, ou seja, trata-se de adequar os direitos aos deveres. Tal adequação permite a realização da sociedade civil, enquanto unidade de pessoas que consentem viver em conjunto através de leis.

publicado por Horacio@Freitas às 19:27

 

Stuart Mill, filósofo inglês do século XIX, contactou desde cedo com as ideias de Jeremy Bentham, amigo de seu pai e fundador do utilitarismo. Na adolescência manifestou o desejo de modificar o mundo através de reformas sociais e políticas. Com Comte, fundador do positivismo, partilhava a ideia de construir uma ciência positiva dos factos sociais que permitisse assegurar a ordem e o progresso da sociedade. No entanto, ao contrário de Comte, o positivismo de Mill, influenciado pelo espírito científico e empirista inglês, afasta-se de qualquer pretensão metafísica de encontrar princípios ou verdades absolutas. Por isso, na sua obra "Utilitarismo", argumenta contra toda a tentativa de fundamentar a moral em valores ou princípios absolutos. As propostas filosóficas de Stuart Mill pretendem afirmar o Homem, os seus direitos e liberdades fundamentais, acreditando que cada indivíduo se encontra em processo de evolução. A ideia de progressão do espírito humano é central na sua filosofia.

 

O hedonismo

 

O utilitarismo clássico adopta o princípio hedonista segundo o qual a finalidade da vida humana é a felicidade. A felicidade poderá ser encontrada pela vivência ou fruição de diferentes prazeres (ligados ao corpo ou ao espírito). Stuart Mill atribui maior importância aos prazeres ligados ao espírito e aos sentimentos nobres da amizade, da honestidade, do amor, etc. São estes prazeres que permitem verdadeiramente ao homem ser feliz.

Todas as acções desenvolvidas pelo homem terão como principal objectivo a felicidade. A felicidade identifica-se com o Bem Supremo. Todas as acções moralmente boas surgem, assim, como instrumentos para alcançar a felicidade. Com efeito, caberá ao indivíduo - sempre em processo de evolução - o papel de escolher acertadamente e agir com rectidão no sentido do bem.

 

A utilidade como critério de moralidade

 

Para que o indivíduo saiba discernir as boas das más acções, isto é, para que possa justificar devidamente as suas escolhas, é preciso encontrar um critério geral de moralidade Este critério é apresentado por Stuart Mill do seguinte modo: "O credo que aceita a utilidade, ou Princípio da Maior Felicidade, como fundamento da moralidade, defende que as acções estão certas na medida em que tendem a promover a felicidade, e erradas na medida em que tendem a produzir o reverso da felicidade. Por felicidade, entende-se o prazer e a ausência de dor; por infelicidade, a dor e a privação de prazer."

É segundo este critério que toda a acção útil se torna legítima. Todavia, a felicidade alcançada não faz do critério moral utilitarista um critério fomentador do egoísmo.

Os prazeres espirituais são os que, segundo Mill, proporcionam a verdadeira felicidade. Com efeito, a moral utilitarista não exclui o altruísmo e a dedicação ao outro.

Segundo a ética utilitarista, o princípio da maior felicidade estabelece que as acções praticadas devem ser capazes de trazer a máxima felicidade para o maior número possível de indivíduos. Ora, a máxima felicidade para todos (humanidade) surge como o objectivo principal da filosofia utilitarista.

 

O consequencialismo

 

A concepção utilitarista da moralidade faz depender a moralidade das acções das suas consequências: se o resultado de uma acção for favorável ao maior número, então a acção será moralmente correcta e moralmente incorrecta se os resultados não forem positivos para a maioria. Independentemente do que se tenha praticado, o valor da acção estará sempre nas vantagens que foi capaz de trazer ou nas consequências da sua concretização.

Criticando a perspectiva kantiana, Stuart Mill manifesta a sua desconfiança face à importância atribuída ao motivo da acção em detrimento das consequências da acção.


Quanto melhor nos conhecermos, tanto melhor poderemos agir. Por isso, a acção moral deve ser precedida e esclarecida por uma reflexão ética. Tendo em conta a distinção já estabelecida entre ética e moral, podemos dizer que é indispensável que cada um se interrogue e reflicta sobre como deve agir (domínio da ética), a fim de escolher a acção mais correcta (domínio da moral). Trata-se de fundamentar as normas, de definir os critérios do bem e do mal.

Neste processo de fundamentação da moral, a reflexão ética pode ser enquadrada em dois sectores distintos: o das morais teleológicas e o das morais deontológicas. As primeiras consideram que o objectivo da moral é alcançar uma vida boa, virtuosa e feliz. São morais consequencialistas. As morais deontológicas, por sua vez, consideram que o valor das acções não reside nas suas consequências ou nos seus efeitos, mas sim na intenção e na boa vontade, isto é, no cumprimento do dever. São morais não consequencialistas.

Enquanto as morais teleológicas concedem prioridade ao conteúdo ou matéria da acção (a felicidade, a utilidade, o bem-estar), as morais deontológicas privilegiam a forma da acção (o dever, a obrigação, os princípios universais).

Um exemplo de uma moral teleológica é representado pela ética de Stuart Mill. Uma perspectiva da moral deontológica é representada pela filosofia moral de Kant.

publicado por Horacio@Freitas às 16:12

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